Política

EXCLUSIVO: Onde está Felipe Augusto?

Ex-prefeito de São Sebastião está no exterior há mais de 60 dias enquanto oficiais de justiça têm dificuldade para citá-lo e notificá-lo nas dezenas de processos judiciais em trâmite, inclusive de violência doméstica

Da redação | Data: 06/03/2025 16:59

Manhã de quinta-feira, dia 20/02/2025. O caminhão de mudança estacionado em frente à casa de número 1670 na Avenida Guarda Mor Lobo Viana, na Praia do Ponta da Cruz, em São Sebastião, chamou a atenção de vizinhos e populares.

Trata-se da residência de Felipe Augusto, prefeito de São Sebastião por dois mandatos seguidos, de 2017 a 2024, que permanece com o paradeiro desconhecido há mais de 60 dias após viajar para o exterior depois de participar da solenidade de transmissão do cargo para seu sucessor Reinaldo Alves Moreira Filho, mais conhecido como Reinaldinho Moreira, no dia 01/01/2025. 


O ex-prefeito mantém ativos dois perfis na rede social Instagram. Em um deles, mantém o user @prefeitofelipeaugusto, conta com mais de 75 mil seguidores e apresenta a seguinte descrição “respeito e responsabilidade com o povo”. No outro perfil, utiliza o user @felipeaugusto01, descreve-se como “um brasileiro que trabalha por políticas públicas e valoriza qualidade de vida do cidadão” e conta com mais de 29 mil seguidores.
Sua presença tem se restringido ao ambiente virtual, porque faz mais de 60 dias que Felipe Augusto se encontra no exterior, a título de “férias” e “descanso”, após o seu período de oito anos como prefeito de São Sebastião.
A última informação sobre o paradeiro de Felipe Augusto foi disponibilizada pelo próprio ex-prefeito no dia 17 de fevereiro na conta @prefeitofelipeaugusto, mostrando-o no campeonato de surfe em piscina de ondas em Abu Dhabi, na capital dos Emirados Árabes Unidos. 
Foram diversas postagens sobre o campeonato de surfe. Nelas, Felipe Augusto noticia sua vida privada ao mesmo tempo em que faz menção a possíveis políticas públicas envolvendo o esporte e marca o perfil oficial da secretaria de turismo de São Sebastião, além de afirmar que está “aprendendo um pouco também sobre esse (sic) novos modelos de negócio”.
 

Enquanto isso, os oficiais de justiça encontram dificuldades para citar e notificar o ex-prefeito nas centenas de processos judiciais em trâmite. Segundo levantamento feito pela reportagem, Felipe Augusto responde a mais de 140 processos, sendo a maior deles na área do direito público e administrativo relativos a atos de gestão à frente da Prefeitura de São Sebastião.
As ações judiciais contra Felipe Augusto se acumulam aos montes. A última ação por improbidade administrativa foi ajuizada pelo Ministério Público de SP no dia 21/02/2025, sob a acusação de fraude em licitação em 33 contratações, com prejuízos que, se comprovados, podem chegar a R$ 1.1 milhão, ainda pendente de citação.  
No dia 31/01/2025, o oficial de justiça certificou no processo por violência doméstica em trâmite na Vara da Violência Doméstica e Familiar de São José dos Campos que se dirigiu ao endereço do acusado para notificar da medida protetiva concedida em prol da sua ex-esposa Michelli Veneziani, porém, a casa estava “fechada”, tendo sido informado por uma vizinha que o acusado estava viajando.
No mesmo ato, o Oficial de Justiça certificou que entrou em contato com o acusado pelo WhatsApp, que a mensagem foi visualizada, contudo, não foi respondida por Felipe Augusto, dando-o “por intimado” da proibição de se aproximar a menos de 200 metros de Michelli, seus familiares e as testemunhas do processo de violência doméstica, sob pena de prisão.
O mesmo acontece com o processo por crime contra a honra movido pelo deputado federal Maurício Neves contra Felipe Augusto. No dia 26/02/2025, o Oficial de Justiça certificou que não encontrou o ex-prefeito na residência e “no endereço fornecido sempre encontrei a casa fechada e fui informado pela vizinhança que o Sr. Felipe Augusto, não se encontra no Brasil e que não se tem previsão de seu retorno a este país”.
A casa de número 1670 é palco de histórias envolvendo poder, dinheiro, armas, traição conjugal, perseguição, ameaça, violência física e utilização da estrutura do poder público em benefício próprio supostamente envolvendo Felipe Augusto contra a sua ex-esposa Michelli Veneziani, com quem manteve relacionamento afetivo por 15 anos.
O terreno havia sido comprado por Michelli ainda em 2013, antes do casamento com Felipe. Com o divórcio, o casal decidiu dividir em 50% o imóvel construído no local, contudo, ela precisou ingressar com ação judicial para que o poder Judiciário arbitrasse alugueres uma vez que ele usufruiu de maneira exclusiva no imóvel sem pagar nenhum valor para a ex-esposa, além de acusar Felipe de usar a Guarda Civil Municipal para impedir a sua entrada na residência e de não ter conseguido retirar todos os seus pertences do local. 
A reportagem teve acesso aos processos judiciais entre Felipe Augusto e Michelli Veneziani. As informações contrastam com a imagem pública construída por Felipe Augusto no site www.felipeaugusto.com.br e nas redes sociais, como, por exemplo, a postagem do dia 24/12/2024 em que Felipe Augusto publicou foto da sua atual esposa Raquel Mendes ao lado dos filhos mensagem de “Feliz Natal” citando Jesus Cristo, amor e família.
ARSENAL DE GUERRA
No processo de violência doméstica, além da proibição de se aproximar da ex-esposa Michelli Veneziani, o poder Judiciário determinou a suspensão da posse e a restrição do porte de armas, determinando a busca e apreensão do armamento.
A diligência foi cumprida no dia 24/01/2025 e, em razão da ausência de Felipe Augusto, o acesso à residência aos policiais foi franqueado por Lucas Augusto, irmão do ex-prefeito. 
Na ocasião em que foram apreendidas, no total, 13 armas e diversas munições, dentre pistolas, carabinas e rifles, além de quatro cofres na residência do ex-prefeito. Posterior à diligência, o acusado, por intermédio dos seus advogados, entregou espontaneamente mais 20 armas que estava em seu poder, totalizando 33 armas e mais de 3 mil munições, dentre elas fuzis. 

A GOTA D'ÁGUA
A gota d’ água para o término do casamento entre Michelli e Felipe teria sido a gravidez da amante Raquel Mendes, gerando o segundo filho do ex-prefeito.
O divórcio com Michelli ocorreu no início de 2021 e não demorou muito para que a amante promovida à companheira oficial também procurasse as autoridades para denunciar atos de agressões.
Em março de 2022, Raquel compareceu à delegacia de polícia informando ser vítima de violência física e psicológico por parte de Felipe Augusto. Na ocasião, declarou que ele possuía “ciúmes” e que tentava “controlar sua vida de várias maneiras, fazendo pressão psicológica a fim de a vítima fazer os desejos do autor”
Sobre o episódio de agressão, Raquel disse que flagrou mensagens no celular de Felipe indicando possíveis relacionamentos extraconjugais e, quando confrontado por ela, Felipe teria segurado em seus braços com agressividade, deixando marcas, apertando seu pescoço e jogando-a ao chão. 
Embora as denúncias de Raquel tenham tornado Felipe Augusto réu no processo criminal nº 1500131-94.2020.8.26.0626, que tramita sob sigilo, a vítima mantém o relacionamento afetivo com seu agressor. 
Já Michelli Veneziani denuncia episódios de agressão envolvendo Felipe há pelo menos cinco anos. Ela sente o peso de um divórcio litigioso com uma pessoa com poder político. Os seus relatos de violência não encontraram respaldo perante as autoridades locais de São Sebastião. 
A separação e o divórcio ocorreram no início do segundo mandato do então prefeito Felipe Augusto. Desde então, passou a ser alvo de boatos, esteve banida socialmente e chegou a ser impedida de ingressar em sua própria residência por integrantes da Guarda Civil Municipal que a obrigaram a permanecer no lado de fora da residência, trajando somente biquíni, após ela retornar da praia.

Certa vez, Michelli acionou o “botão de pânico” do programa municipal de proteção às mulheres vítimas de violência, contudo, os agentes públicos teriam deixado de atender a ocorrência uma vez que o conflito dela era com o chefe do Executivo municipal. 
Passando a temer por sua integridade física, Michelli decidiu mudar-se para São José dos Campos, onde reside no apartamento de propriedade do seu pai.
Embora a separação tenha ocorrido no início de 2021, o último B.O. foi registrado no dia 22/01/2025, narrando episódios de violências psicológica, patrimonial e moral, denunciando processo de escalada da violência, relatando temor quanto à sua integridade física e requerendo medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha.
Ao ser ouvida na delegacia, Michelli revelou que, ainda na constância do casamento, Felipe teria colocado um rastreador em seu veículo, para monitorá-la; que Felipe ostentaria vida de luxo ao mesmo tempo em que não cumpre com as obrigações da pensão alimentícia; que teria prometido visitar a filha, porém, desmarcado em cima da hora, deixando a menina com as malas prontas para visitar o pai; que a filha teria presencial outro suposto episódio de agressão de Felipe contra a madrasta Raquel durante viagem entre eles em dezembro de 2024, na Bahia; que Felipe teria apresentado notório processo de escalada de violência, temendo por sua segurança.
Michelli contou ainda para as autoridades que Felipe teria empunhado uma arma no momento em que decidiu contar sobre a gravidez da amante, além de supostos episódios de agressão física, destacando que precisou levar quatro pontos na cabeça após ser empurrada pelo agressor e bater a cabeça.  
A investigação da DIG de São José dos Campos sobre o episódio do rastreador encontrado no carro de Michelli foi concluída em fevereiro de 2025, tendo identificado Felipe Augusto como sendo “o proprietário do rastreador”. O equipamento foi encontrado em junho de 2021, portanto, após a separação e o divórcio do casal, enquanto Michelli abastecia o carro em um posto de gasolina. 
A mencionada “escalada da violência” refere-se não só à suposta agressão à madrasta Raquel em dezembro de 2024 como também às ameaças explícitas contra Michelli, sua mãe Myrlene Veneziani e seu irmão Matheus Veneziani, ocorridas no dia 01/01/2025 em São Sebastião, após o evento de transmissão do cargo de Felipe Augusto para seu sucessor Reinaldinho, dando ensejo ao penúltimo Boletim de Ocorrência registrado por Michelli contra Felipe. 
Na ocasião, durante o evento de transmissão do cargo para seu sucessor, Felipe Augusto teria dedicado parte do seu discurso para atacar a honra e a imagem de Michelli perante todos os presentes, dentre eles a filha de 11 anos, que estava acompanhada pela avó Myrlene, mãe de Michelli.
Perante o constrangimento causado pelo discurso, avó Myrlene contou com a ajuda da madrasta Raquel para retirar a criança do local e levá-la para casa. Quando a avó materna foi até a residência do casal para buscar a menina, de acordo com o registro policial, Felipe “abriu o portão violentamente e saiu da residência gritando, descontrolado e agressivo e em tom de ameaças”
A avó Myrlene contou para a polícia que “ele se dirigiu ao meu carro, e se dependurou na janela, tentando me alcançar, e desferiu, uma série de ameaças a minha pessoa, ao meu filho [Matheus Veneziani, atual prefeito de Caraguatatuba], minha filha [Michelli] e minha família como um todo, usou de palavras como: “você é uma puta, vagabunda, sua filha acabou comigo, fez mais de 30 denúncias contra mim na polícia e no ministério público, eu vou acabar com vocês, destruir a família de vocês, acabar com o Mateus. Minha neta saiu chorando compulsivamente. Ele ainda repetiu novamente os insultos e entrou na casa”.
Depois deste último episódio de violência, Felipe Augusto embarcou para o exterior e nunca mais foi visto. A filha de 11 anos do ex-casal foi diagnosticada com ansiedade, distúrbio alimentar e vitiligo possivelmente pelo conflito existente entre os pais.

PODER, INFLUÊNCIA E IMPROBIDADE

A influência de Felipe Augusto na atual gestão do prefeito Reinaldinho pode ser medida pela quantidade de ex-integrantes do primeiro escalão que foram mantidos no governo: 11 pessoas no total.
A irmã Adriana Augusto foi mantida no primeiro escalão do atual governo, passando a exercer a função de secretária de Planejamento da Prefeitura de São Sebastião. Já o irmão Lucas Augusto foi nomeado como diretor do Departamento de Fiscalização e Tributação na secretaria da Fazenda.
Em novembro de 2024, ainda com o governo sob a batuta de Felipe Augusto, a 2ª Vara Cível de São Sebastião homologou o acordo firmado entre Felipe Augusto e Lucas Augusto com o Ministério Público de SP para encerrar o processo por improbidade administrativa, cujos réus aceitaram pagar a quantia de R$ 20.000,00, em 05 prestações mensais, para encerrar o processo por nepotismo após o então prefeito nomear seu irmão para cargo comissionado em seu governo.
A quantia de R$ 20 mil foi paga em espécie, cuja prática tem sido recorrente no pagamento dos boletos decorrentes de processos por atrasos na pensão alimentícia de Felipe Augusto para com a sua filha, de 11 anos.
Contudo, tamanha influência no Governo Reinaldinho não foi capaz de segurar a licitação de R$ 84 milhões para a coleta de lixo iniciada pelo então prefeito Felipe Augusto no dia 31/12/2024, seu último dia como prefeito municipal, após o Tribunal de Contas do Estado de SP suspender o edital por suspeita de direcionamento.
Outro lado
A reportagem não conseguiu localizar o ex-prefeito Felipe Augusto para que pudesse apresentar a sua versão dos fatos narrados, porém, ressalta que o espaço permanece aberto para futuras manifestações, caos haja interesse. 
O atual prefeito de São Sebastião, Reinaldo Alves Moreira Filho, não respondeu a solicitação de informação.

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